Crianças: Políticas públicas bem sucedidas de enfrentamento à violência sexual

“Dói falar disso.  De lembrar as coisas horríveis que eu já́ passei. Só que, por um lado, é bom: sinto-me livre de tudo. Completamente, não, porque isso vai ficar pelo resto de minha vida.

(depoimento de uma adolescente de 17 anos de idade, prostituída desde os 13- Relatório da CPMI, 2004). O Brasil adota o princípio da proteção integral dos direitos das crianças e adolescentes. O Estatuto da Criança e do Adolescente, no artigo 70, preconiza: ...

“É dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente.

O objetivo deste texto é indicar políticas públicas e medidas necessárias ao enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes. Algumas sugestões:

1 Uma das políticas públicas que precisa ser adotada é a criação de uma rede de atendimento especializado, nas regiões mais endêmicas de violência sexual contra crianças e adolescentes. Obrigatoriamente, a rede deve ser composta de atendimento psicossocial, jurídico e médico, integrada aos Conselhos Tutelares. Ampliando, assim, o acesso de crianças e adolescentes e suas famílias aos serviços de proteção social básica e especial por meio da expansão e qualificação da política de assistência social.

O QUE É O PROGRAMA SENTINELA
É um conjunto de ações sociais especializadas e multiprofissionais dirigidas ao atendimento de crianças, adolescentes e famílias envolvidas com a violência sexual. O programa foi estruturado para atender as determinações da Constituição Federal, do Estatuto da Criança e do Adolescente, da Lei Orgânica de Assistência Social e do Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-Juvenil.
O Programa Sentinela constitui-se numa ação de responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome - MDS, inserido no Programa de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, coordenado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República e, está atualmente presente em todos os estados da federação e no Distrito Federal.
Em 2006, com a implantação do Sistema Único de Saúde-SUAS, o Sentinela se insere como serviço do CRAS – Centro de Referência de Assistência Social, obedecendo as Normas Operacionais Básicas da Política Pública de Assistência Social, alcançando uma abrangência de 1104 municípios brasileiros

2 Também, a título de política pública, devem ser realizadas ações preventivas contra a violência sexual. São ações de educação, sensibilização e de autodefesa a serem difundidas no ambiente escolar e social (normalmente junto às igrejas) junto às potenciais vítimas. Importante que os professores das regiões endêmicas sejam orientados e capacitados para identificar sinais que possam sugerir possível violência sexual contra crianças e adolescentes, fornecendo, ainda, meios para que as denúncias aos órgãos competentes sejam realizadas de forma a preservar a identidade do denunciante.


3 Realização de um mutirão de atendimento pediátrico nas regiões endêmicas de violência sexual, de modo a identificar crianças que tenham sinais de terem submetidas a qualquer forma de exploração sexual ou violação de direitos.

4 Ampliar e universalizar o acesso de crianças e adolescentes a políticas e programas de esporte e lazer, onde terão acompanhamento multidisciplinar.

5 Fomentar a criação de programas educativos de orientação e de atendimento a familiares, responsáveis, cuidadores ou demais envolvidos em situações de negligencia, violência psicológica, física e sexual.

6 Ampliar e aprimorar o funcionamento de conselhos tutelar nas regiões endêmicas de violência sexual contra crianças e adolescentes, integrando os conselhos tutelares aos serviços da rede pública de saúde e da Defensoria Pública.

7 Criação de um serviço de recepção de denúncias telefônicas sobre abuso sexual experimentado por crianças e adolescentes, fixando prazo para que os Conselhos tutelares investiguem se há indícios de veracidade nas denúncias.

8 Efetivação da prioridade absoluta no ciclo e na execução orçamentária governamental para a Política de proteção às crianças e adolescentes, impedindo a realização de cortes orçamentários.

9 Obrigatoriedade que os agentes públicos, especialmente ligados à repressão policial e à saúde pública, notifiquem os Conselhos Tutelares e Núcleo da Defensoria Pública com atuação junto à Vara da Infância e Juventude, acerca de todos os crimes que envolvam violência sexual contra crianças e adolescentes, de modo a facilitar a adoção de medidas cíveis protetivas em favor das crianças e adolescentes.

10 Capacitação de profissionais da mídia sobre a temática da violência sexual contra crianças e adolescentes, para que, ao noticiar casos de violência sexual, saibam da importância de se divulgar a necessidade de denunciar os casos de violência e de divulgar sobre a existência da rede de atendimento. Também é importante conscientizar que a explicitação de detalhes e imagens, muitas vezes, serve apenas para constranger e estigmatizar as vítimas, além de possibilitar que outros agressores mimetizem as condutas.

11 Obrigar os estabelecimentos de ensino a comunicarem o nome dos alunos que estejam em situação de evasão escolar ao Conselho Tutelar, pois é comum que as vítimas de violência sexual evadam-se da escola, como forma de os agressores ocultarem o crime.

12 Criação de um protocolo de atendimento da criança e do adolescente vítima de violência sexual e difusão desse protocolo junto aos órgãos públicos e privados de atenção à criança e adolescente.

Uma sociedade que se diz civilizada não pode conviver com a degradação física e moral a quem são submetidas muitas crianças apenas por serem pobres. A omissão do Estado em envidar esforços para garantir uma infância sadia, longe da violência, das drogas e dos desrespeitos aos seus direitos não é apenas uma omissão grave, é um crime contra o futuro, contra a humanidade.
Fonte: Por André de Moura - 18/06/2015 - - 15:12:22